Ainda a malta do não...
"Trata-se de alteração da noção daquilo que é mau e daquilo que é bom. Quando ilegal, o aborto é visto como algo mau, a evitar, e as mulheres hesitarão em usá-lo. Se for legal, o aborto será visto como uma coisa normal e haverá menos problemas de consciência quando se recorre a ele. Numa sociedade católica como a nossa, a noção de "pecado" está muito presente na cabeça das pessoas, mesmo que elas se declarem agnósticas ou ateias. Se o estado legalizar o aborto, estará a atenuar essa noção de "pecado", estará a diminuir o sentimento de culpa e isso provocará uma subida no número de abortos."
Afinal, estes senhores não querem é que a gente peque.... mas não me lembro de lhes ter passado procuração para velarem pela minha alma.
Comentário de Fernando Alves no Womenage a Trois
11 comentários:
... sem fala...
eu só peco (alguém q me encontre a cedilha) ... pq será q a mãezinha dele n se lembrou de pecar tb? tão, mas tão preocupados com as questões morais (falsas claro), q até me comovem, sério, já acendi uma velhinha por eles e tudo. Rais parta, hipócritas do camandro, este assunto irrita-me profundamente, falam do aborto como quem fala de um método anti-concepcional, como se as mulheres optassem por isso levianamente devem pensar q é como ir ali ao super comprar detergentes, poupem-me ... certo é q, com argumentos destes, nem as profundamente católicas e minimamente inteligentes conseguem convencer, enfim, como costumo pensar, o mundo tb é dos fracos e pobres de espírito...
Por falar em coisas que nos chateiam:
A mim chateia-me particularmente o facto de não terem reparado que a palavra pecado estava entre aspas e que tinha como intenção definir "algo que está errado".
Também me chateia que certos partidários do "sim" apenas o sejam porque têm raiva à Igreja e estejam sempre à espera de uma oportunidade, ainda que mínima, de associar os defensores da vida à ICAR.
Chateia-me ainda que, alguém que diz que o aborto é mau mas vota sim, me acuse de ser hipócrita.
A propósito, parabéns pelo blogue. Só o vi de relance mas parece ser muito interessante.
Fernando (andamos sempre plos mesmos sítios?), não resisto a comentar que pôr aspas no pecado e defini-lo como "algo errado" não muda grande coisa. Errado de que ponto de vista, com base em que critérios, errado porquê e para quem? E a lei serve para sustentar (algumas) morais ou para tornar possível a convivência entre várias morais?
Fernando,
eu não tenho raiva à ICAR. Aliás, metade da minha família é católica e até sou bisneta de um padre...
O que não aceito é que me imponham as regras de uma religião que não professo. Intelectualmente, posso até aceitar a ideia de crime contra a vida, apesar de não concordar no caso de embriões.
Mas não posso admitir que me imponham regras católicas, nem judias, nem muçulmanas nem coisa nenhuma.
O estado está acima da religião, exactamente para que os cidadãos possam viver com harmonia.
A maternidade é demasiado séria para que seja apenas reflexo de um azar.
Eu quero mulheres felizes por estarem grávidas.
Vocês apenas as querem grávidas, é essa a diferença.
ps - obrigada pelo elogio ao blog :)
Cara fuckitall,
é sempre um prazer encontrá-la e discutir consigo estes assuntos.
Vou colocar um caso que penso que ilustrará na perfeição aquilo que eu queria dizer. Peço desde já, por favor, para não interpretar mal as minhas palavras.
Coloco o caso do incesto:
O incesto é visto como algo normal em certas regiões da India, onde vigora o sistema de castas e onde são comuns os casamentos consanguíneos para evitar a perda da riqueza familiar. Dois irmãos são duas criaturas independentes, com o único facto de serem filhos do mesmo pai e mãe. Porque razão então consideramos nós que o incesto é algo de errado e noutras culturas isso não acontece?
O repúdio ao incesto foi inicialmente desencadeado pela Igreja, que o catalogou como pecado. Isso serviu para evitar muitos casos de incesto, mesmo apesar de ele ainda subsistir. Hoje, mesmo os não católicos consideram o incesto como uma barbaridade e algo de chocante, mas agora, ele é contrariado não tanto por ser um "pecado" mas sim por deixar marcas psicológicas profundas em quem o pratica ou até com base em argumentos científicos, como por exemplo a maior incidência de bebés com deficiência ou até abortos.
Repare: o que a Igreja começou por catalogar como "pecado", hoje é visto como algo de errado mesmo pelos não crentes. Era precisamente isto que eu queria elucidar. Quer queiramos quer não, vivemos numa sociedade influenciada pela ICAR durante milhares de anos. Como já disse algures, um agnóstico católico não é igual a um agnóstico muçulmano.
Espero, mais uma vez, que não deturpem as minhas palavras. Não concordo com o incesto e aviso já que não vale a pena vir com a conversa de padres que o cometeram apesar de a Igreja o catalogar como pecado porque não é isso que está em discussão. Lamento que muitas vezes a discussão sobre o aborto se transforme numa discussão sobre a Igreja. Isso não interessa e só confunde as pessoas e, além disso, estou cansado que pensem que eu, por defender a vida, tenho que defender a Igreja ou concorde com tudo o que ela diz.
Bem, a mazinha respondeu-me enquanto eu estava a responder à fuckitall, mas eu respondo-lhe já:
Penso que se trata de uma confusão pensar que a Igreja quer impor certas morais ao povo. Isso já é passado. Não digo que ainda não se verifique, mas felizmente as pessoas são cada vez mais inteligentes e sabem diferenciar as coisas.
É possível defender a vida sem recorrer a argumentos religiosos mas, como a Igreja também está empenhada na defesa da vida, as pessoas acabam por pensar que lhes estão a impor uma moral.
Quanto ao direito a escolher, vai-me perdoar pela insistência e pela intolerância: essa escolha tem de ser feita a montante. Há tantas formas de não engravidar! Eu sei que há azares e deslizes, mas também sei que eles são muito menos frequentes em mulheres esclarecidas.
Também eu concordo que só deveriam existir grávidas felizes. Felizes e apoiadas, acarinhadas pela família, pelo estado, pela sociedade e pelo pai da criança.
Minha cara, triste sociedade será esta quando a única coisa que poderemos oferecer a uma mulher em apuros é a possibilidade de abortar. E penso que tanto eu como você pensamos que o aborto, mesmo legal, é uma coisa horrível. Não será então mais lógico fazer tudo ao nosso alcance para evitar que ele seja a única solução?
E não seria mais lógico, mudar tudo e começar outra vez?
E quem disse q a sociedade quer pessoas (mulheres) esclarecidas?
E quem lhe disse que não são?
(Eu não voto sim ao aborto, sim à legalização, é diferente, e é essa diferença q vocês não conseguem perceber).
O problema foi e sempre será a hipocrisia, porque legal ou ilegal, vai continuar a ser praticado, enquanto ilegal é melhor pra uns, que enchem os bolsos.
(irra, que me chateia este assunto)
1. O incesto é um conceito universal; todas, TODAS as sociedades humanas têm um conceito de incesto. De facto, nem existiria sociedade se não existisse incesto, porque ficávamos todos na toca a reproduzirmo-nos entre pais, filhos e irmãos. O incesto é o que nos empurra para fora e nos faz estabelecer laços com outros grupos ("famílias"). O que varia é a definição que se faz de incesto, a definição daqueles com quem, em cada sociedade, podemos ou não casar. Isso só prova que a proibição do incesto não é natural, mas fruto de factores sociais e culturais.
A Igreja alterou, no curso da nossa história, as definições que foi fazendo de quais são as relações incestuosas, mas não inventou, de forma alguma, o incesto. Aliás, o conceito tem esticado e encolhido com frequência ao longo do séculos, mesmo no nosso universo cultural.
2. Não questiono o peso cultural do cristianismo e do catolicismo na nossa sociedade. Nem se trata de influência, a nossa cultura está demasiado intimamente ligada à história da Igreja, fazem parte uma da outra. Sei que, mesmo não professando nenhuma religião, o meu próprio processo intelectual, ético e até emocional se faz nos termos desse contexto cultural. Isto é um "pau de dois bicos" também, é por ter uma influência pervasiva na nossa cultura que a ICAR tem sempre que aceitar tantos não-crentes a participar nos seus debates.
Agora, aceitar que essa ligação existe é uma coisa; que tenhamos que aceitar acriticamente as propostas que a hierarquia católica faz, ou que o(s) Estado(s) seja(m) correia-de-transmissão dessas propostas é outra coisa muito diferente.
3. A noção de pecado, nisso estamos de acordo, foi (é) um instrumento simbólico/cultural muito eficaz para impôr ideias e modelos de funcionamento.
Mas para mim um dos pontos fortes da "civilização europeia" (deixem passar) é a tradição de diversidade e conflito ideológico que ela sempre encerrou. E nesta matéria estou claramente do outro lado da barricada em relação à hierarquia católica: reivindico o meu direito a combater a noção de pecado associada à sexualidade e ao controlo sobre a maternidade. Não acho que venha daí nada que eu considere bom.
...mas estamos a afastar-nos muito da questão original: não acredito que o Fernando realmente pense que é boa ideia alguém ser mãe só porque se sentiu culpada.
Claro que não acredito. Esta discussão tomou um caminho totalmente distinto do correcto. Neste momento devemos centrar as nossas atenções no aborto, que é o que urge esclarecer.
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